quarta-feira, 13 de julho de 2022

O pescador e o vento

Foto de Minotauro 

O pescador e o vento

*************

"Muito vento hoje. Agora que passou o inverno, quem dita lei no pedaço é o vento. A pesca foi boa? A pesca foi ruim? Depende do vento. Foi caçar isca (camarão) no canto e não conseguiu? Foi por causa do vento. É assim todo dia. Só não venta de manhãzinha, ao raiar do dia. Pelo resto, nesta época do ano pode ventar forte a qualquer momento e atrapalhar o serviço".

O sertanejo nordestino chama de inverno a estação da chuva, qualquer que seja a época do ano. A estação do inverno começou de fato há algumas semanas, nesta banda do planeta, mas pouco importa. O caboclo sertanejo, pescador, caçador, agricultor, que lê os sinais da Natureza, tem referências diretamente relacionadas ao meio ambiente do qual faz parte, que se distinguem das convenções oficiais.


Chaf chaf chaf chaf. A canoinha vem remontando o rio com o frenético remar de um único homem a bordo. As cadelas latiram, eu dei o bom dia e me levantei da cadeirinha. 

O pescador sem pensar duas vezes deu um jeito no remo e encostou na margem, segurou um galho e depois passou um cabinho no mesmo para amarrar a canoinha.

Cabeça, que conhece e entende bem as palavras "fique tranquila", sentou-se calmamente, sem chegar perto do homem. Branquinha, desconfiada, ficou vigiando de longe, depois relaxou ela também.

Ofereci café, ele não quis. Ofereci fumo, aceitou; arrochou um cigarro de fumo preto que comprei na feira para essas ocasiões e para entregar ao Caipora, se aparecer pra mim.

Agachou-se no fundo da canoa e ficou pitando enquanto durou a conversa. Achei bonita a canoa dele, semi-nova, esguia, com apenas duas tabuinhas finas como bancos. À diferença do pescador do Vale do Assu, o remador ribeirinho do Parnaíba usa um único remo tipo pagaia e fica à proa da embarcação.

Ele me disse, quando indaguei, que foi ele mesmo quem construiu a canoa e que gastou setecentos reais nela. Logo acrescentou que Zé do Café vende uma novinha com quatro metros de comprimento por dois mil.

Falei para ele do ano novo dos povos originários do Nordeste, das festas juninas e dei pra ele um livrinho do Setestrelo. Mostrei para ele meu nome na capa do folheto. Ele me disse que aprendeu a ler e escrever, mas que esqueceu; iria pedir para a sobrinha ler meu livrinho pra ele.

Assim como chegou, foi embora; rapidinho deu algumas remadas para afastar-se da margem. Parou por um momento, levantou o braço para despedir-se e me disse em voz alta, como se tivesse lembrado só na hora de fazê-lo, o nome dele: Firmino Vivaldo.

Seguiu remando.

Chaf chaf chaf chaf....

Nenhum comentário: